O medo dos germes fez da pandemia o triunfo do germofóbico

O medo dos germes fez da pandemia o triunfo do germofóbico
A pandemia foi o triunfo do germofóbico, diz ao Observador Isabel Cocheira. Fonte: Observador © NUTHAWUT SOMSUK/ISTOCKPHOTO

No artigo do jornal on-line Observador, da autoria de Ana Cristina Marques, com o título Adiar consultas, ignorar os números, desinfetar “até os cantos das embalagens”. A ansiedade na pandemia, a nossa associada, a psicóloga clínica Isabel Cocheira, começa por referir que A pandemia foi o triunfo do germofóbico (medo dos germes), uma vez que, com a chegada da pandemia, aumentou a margem de casos de forma significativa, com a psicóloga a recordar a história de uma utente com as mãos em ferida de tanto as desinfetar. “Antes as pessoas faziam pesquisa [de sintomas] no Google, agora isto tomou uma proporção social no sentido em que existem vários alertas. Fala-se constantemente em sintomas como vómitos, diarreia ou febre, o que vem legitimar receios que só existiam antes na esfera individual”, explica.

O facto de nos mantermos continuamente alerta durante o dia pode traduzir-se em alterações do sono. “As pessoas estão muito exaustas”, assegura Cocheira. Além da pandemia, com a qual convivemos há cerca de um ano, as novas variantes e os hospitais em sobrecarga vêm agravar o sentimento de incerteza. E, em momentos como estes, a ansiedade pode entrar em cena e originar decisões nem sempre certeiras, como adiar consultas e/ou exames com receio de se ficar infetado.

Em 2020, assegura Cocheira, a APPA recebeu vários pedidos de prescrições de um medicamento em particular, Victan 2mg, que chegou a estar indisponível no mercado“Assim que entrámos em confinamento, as pessoas começaram a disparar com mensagens no Facebook da APPA a solicitar prescrições”. A comercialização do medicamento indicado para ansiedade e sintomas nervosos, que estava indisponível desde julho, foi reposta em outubro de 2020. “As pessoas estão a tentar não ir ao hospital, mas procuram outras vias para chegar aos fármacos, isso pode levantar casos sérios de saúde”, comenta ainda Cocheira. “Medicamentos não são exames de rotinas.”

No fundo, pensamentos e cenários catastróficos podem impedir as pessoas de fazerem a sua vida normal e até de concretizarem objetivos que tinham em mente. A psicóloga clínica Isabel Cocheira lembra que a ansiedade no seu extremo pode estar ligada a situações traumáticas do passado — significando que a pessoa não está a responder ao mundo exterior, mas sim ao próprio passado. “Pode dar-se o caso de a pessoa saber que determinada situação não é perigosa em si, mas fazer a ligação a uma outra experiência onde pode ter tido riscos verdadeiros”, explica. A pandemia pode ainda funcionar como um acelerador de paranóias já existentes, isto é, de “desconfiança ou ideias delirantes”, uma realidade que sai reforçada quanto mais as pessoas estiverem isoladas e menos interações sociais tiverem.

Para além da participação de Isabel Cocheira, neste artigo, podem-se ainda ler os testemunhos de Catarina Beato (Blogger), de Maria Reinalda (35 anos), de Raquel Salgueiro Póvoas (31 anos) e a participação da Psicóloga Clínica, Catarina Lucas e da Diretora Técnica da Domus Mater, Sofia Santos.

Para saber mais como lidar com a sua Ansiedade, pode Falar com a APPA

Psicologia de Orientação Psicanalítica

Neste artigo a autora apresenta a importância da psicologia clínica, de orientação psicanalítica, na relação entre a pessoa e o psicoterapeuta, para que a pessoa possa (re)começar a viver.

Psicologia de Orientação Psicanalítica

A psicologia clínica é um mundo.

Existem várias orientações teóricas, técnicas e práticas diversas, o que se traduz em várias formas de olhar, diferentes perspetivas, lupas até, para perceber e compreender o Ser Humano.

O psicólogo, ou psicoterapeuta, tal como a pessoa que procura ajuda, é um Ser Humano. E como Ser Humano, também tem as suas coisas. Sente coisas. Tem um passado, um presente e um futuro. E por ser Ser Humano, tem direito às suas coisas, mas também, tem a responsabilidade de pensá-las, transformá-las. E, para poder transformá-las, deverá fazer a sua psicoterapia pessoal (ser ele o sujeito!).

Assim como, deverá ser seguido em supervisão clínica e intervisão clínica, juntamente com outros profissionais da área. O terapeuta, deve estar bem resolvido. Isto porque tem à sua responsabilidade pessoas. Pessoas estas que procuram a sua ajuda. Pessoas estas que precisam de colo (um colo mental). Estas pessoas, muitas vezes, estão num sofrimento tal que nenhuma palavra pode, ou consegue, definir o que sentem. Às vezes, o silêncio também fala… grita, chora, enlouquece.

Estas pessoas, precisam urgentemente de renascer. Voltar a ser. Para isso, pessoa e terapeuta têm de se encontrar. Pela humanidade, pelas características de ambos, pela intuição, pela teoria e pela técnica e juntos constroem uma nova relação: a relação terapêutica, sã e sanígena, capaz de amar e fazer amar, criativa e criadora, molde para as relações do mundo extra-consultório.

Este encontro a dois, é uma verdadeira co-construção. O terapeuta não é o detentor da verdade absoluta. O sujeito não é o único que sofre. É uma nova relação que se estabelece. Uma relação bidireccional. Este encontro, propicia o estar com.

Estar com, é estar com a pessoa. É perceber e ter-se interesse pela aquela pessoa – e isto, é fundamental em qualquer prática clínica. É sentir e desenvolver sentires múltiplos: quer paciente, quer psicoterapeuta. É escutar o outro, sem julgamentos ou compreensões precipitadas. É estar atento, é ser empático. É receber o outro e acolhê-lo de forma incondicional. Aceitá-lo. Tolerar a diferença. É também pensar com. Ajudar a que a pessoa se pense. É poder transformar aquilo que não tem nome. Dar-lhe um sentido. Potenciar a transformação. Estar verdadeiramente nesta nova relação, a relação terapêutica, sem memória e sem desejo. Estar. Ser presença. Ser suficiente. Ter amor à verdade.


Assim, a psicologia clínica de orientação psicanalítica, a minha psicologia clínica, é um encontro a dois. A sós. Para que depois, a pessoa, possa (re)começar a viver. É um renascer no útero mental do psicoterapeuta em direção à vida que estava em suspenso, “sozinho e em relação com o mundo de todas as coisas, seres e pensamentos”.

Ser-se psicólogo, é também ser “catalisador da reação espontânea” e permitir que um outro possa reparar o que quiser da sua realidade, abrindo portas para que este outro possa relacionar-se melhor consigo e com o mundo. Ou, de forma abreviada, ser-se “a chave de ignição que precisava para as coisas lá fora” como me disse um dos meus pacientes. Esta é a psicologia clínica que em que acredito e “que sorte tenho eu… de me pagarem e ainda por cima poder aprender com os meus pacientes”.

Autora: Soraya Bento Morais, Psicóloga Clínica, Dezembro 2019

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